CIEP no Rio de Janeiro é modelo em educação inclusiva

Rio, 30 de agosto de 2012

"Vocês não ouvem os assustadores gritos ao nosso redor que costumamos chamar de silêncio?". O questionamento, que surge no prólogo de O enigma de Kasper House, obra-prima do alemão Werner Herzog, pode refletir o universo dos surdos que vivem sem atendimento adequado às suas necessidades. Uma instituição de ensino no Rio de Janeiro, no entanto, tenta reverter esse quadro de exclusão ao desenvolver um excelente trabalho voltado para a inclusão da pessoa com deficiência auditiva. O CIEP José Pedro Varella, localizado no Centro do Rio, é referência em ‘educação inclusiva’, onde os alunos – muitos deles adultos e analfabetos – ganham o direito de se libertar de um universo de silêncio para se expressar através da linguagem.

O mural da sala de aula está repleto de fotos tiradas por alunos. Eles chegam sem se comunicar, isolados, agressivos. Logo começam a olhar para os amigos, os visitantes, a professora, arriscam seus primeiros gestos, voltam a sorrir. “Fico impressionada com o desenvolvimento de todos os meus alunos, muito além das minhas expectativas”, afirma a fonoaudióloga Sheila Oliveira que, sem dúvida, tem o mérito do progresso de toda a turma.

Sheila trabalha com surdos para a Prefeitura do Rio desde 1994, quando, após passar em concurso público, começou a dar aulas para uma classe especial formada por pessoas com essa deficiência. Em 2002, foi convidada a alfabetizar uma turma de surdos adultos analfabetos, muitos sem conhecimento da língua de sinais. Os alunos deveriam, em seguida, serem incluídos em classes regulares do ensino de Educação de Jovens e Adultos (EJA) no CIEP José Pedro Varella. Ela descreve que foi um processo difícil e progressivo. “Fizemos inúmeras  reuniões, palestras, seminários. Eu precisava mostrar aos professores a capacidade dos alunos de acompanharem as turmas regulares”, explica.

Vencidas todas as dificuldades, em 2006 foi realizada a primeira formatura de uma turma de surdos. Hoje, o grupo conta com 26 estudantes, oficinas de LIBRAS são ministradas para todos os profissionais engajados no processo de transformação do colégio. O CIEP está se tornando uma escola bilíngue, o grande sonho de Sheila. “Agora, eu posso dizer que acredito em educação inclusiva. Espero que o exemplo daqui seja levado para todas as instituições de ensino brasileiras”.

A paixão de Sheila pelo tema é antiga, seu primeiro namorado era surdo: “Meu sonho era não poder escutar. Queria descobrir esse outro universo”, conta. Tentou mesmo, na época, furar um tímpano, mas a audição comprometida foi logo recuperada. E ela resolveu cumprir o objetivo por outras vias “menos dolorosas”, e “construir um sonho ainda maior”